terça-feira, 22 de março de 2016

Spike está ficando surdo

Ontem, segunda-feira (21), entrei em casa pela porta dos fundos. Spike estava lá na frente, ansioso, rígido, no máximo da concentração, olhando para o lado oposto, porque meu pai havia saído – meu pai é o grande Deus pra ele, já eu não sou tão querido assim.

Cheguei bem próximo a ele, que estava com aquele rabo sempre riste em minha direção. Spike me veria e me cumprimentaria como se deve: aquele balançar de rabo (não tão forte como ele faz quando é com meu pai), um pulo com as duas patas nas minhas coxas, sendo retribuído com um afago na cabeça. Bati com os pés no chão, para que me ouvisse. Spike não se mexeu, os olhos encarando a porta. Bati com os pés outras duas, três vezes. Já me bateu um aperto no peito.
 
Chamei o cachorro pelo nome, aproximei-me. Finalmente ele virou o rosto e me viu. Ainda não sei dizer se ele foi atraído por alguns dos meus sinais ou apenas olhava despretensiosamente. Não mostrou constrangimento, veio até mim, rabo a balançar, afago na cabeça.

Por muito tempo eu tentei negar, mas Spike está ficando velho. Spike está ficando surdo. Eu já notava alguns sinais. Quando eu arremessava algum aperitivo que fosse – uma pipoca, por exemplo -, ele já não se guiava pelo som de onde a comida havia caído, apenas ficava cheirando o cômodo todo até que a tal pipoca aparecesse embaixo das suas narinas. Já havia acontecido dele não notar minha chegada até ter me visto.

Spike está ficando velho e eu estava negando. Até tê-lo visto não me ver enquanto eu praticamente sapateava logo atrás. Que aperto no peito! Diz minha mãe que ele está ficando cego. Os olhos do animal parecem estar ficando brancos mesmo. Uma ferida em seu rabo não permite que o pelo cresça no local, e penso que se ele estivesse mais saudável já estaria cicatrizado. Há pelos brancos espalhados entre o pelo negro, alguns perto dos olhos, dando ar de velho. Às vezes ele me cumprimenta bastante desmotivado, não sei se por um desgaste que vem sentindo recentemente ou o fato já citado dele não me admirar tanto assim.

Como deve estar sendo a experiência? O quanto ele está ouvindo? Por que Spike não está desesperado? Por que ele continua tão tranquilizador, andando despretensiosamente pela casa? Pedi a minha mãe que procurasse algum veterinário conhecido. Semana que vem meu cachorro deve ser avaliado. Teremos um especialista carimbando que Spike está ficando velho e eu não sei como vou lidar. Talvez ele devesse compartilhar do meu desespero e não ficar caminhando despretensiosamente pela casa. “Isso me dá um aperto, Spike”, eu digo quando ele está olhando pra mim, mas não sei se ele me ouve.